terça-feira, 28 de abril de 2015

Aula 4 - Causalidade

CAUSALIDADE MÉDICO-LEGAL DO DANO

1.        Conceito

É o estudo das energias que, ofendendo a integridade física ou a saúde – quer do ponto de vista anatômico, quer do ponto de vista fisiológico ou mental – ocasionam lesões corporais e morte.

2.        Energias de ordem mecânica

É a energia cinética, que atua sobre um corpo (E = M x V²). O que varia é a velocidade. Ex.: suavemente um tijolo sobre a cabeça de alguém, o mesmo não produzirá nenhum trauma. Porém, se o tijolo for atirado com força, pode provocar um corte ou até mesmo uma fratura de crânio. O tijolo (massa) é o mesmo; o que variou foi a velocidade.
Existem alguns objetos cuja massa, por si só, já produzem energia suficiente para provocar um trauma. Ex.: um cofre de 3.000 Kg sobre a cabeça de alguém.
O que determina a intensidade do trauma é o resultado M x V² (massa x o quadrado da velocidade). 
         A energia pode atuar de várias maneiras: explosão, impacto, tração etc.
         Existem três grupos de instrumentos:   
·          que atuam num único ponto – ex.: perfurantes;
·          que atuam numa linha – ex.: cortantes;
·          que atuam num plano ou superfície – ex.: contundentes.

2.1. Classificação dos instrumentos mecânicos

a.        - armas naturais – mãos, pés, cotovelos, joelhos, cabeça, dentes, unhas etc.
b.        - armas propriamente ditas – armas brancas (punhal, espada etc.) e de fogo (revólver, pistola, carabina etc.).
c.         - armas eventuais – faca, canivete, martelo, machado etc.
d.        - maquinismos e peças de máquinas
e.        - os animais – cão, gato, tigre, onça etc.
f.          - meios diversos – quedas, explosões, precipitações etc.

- modos de atuação: por pressão, percussão, tração, compressão, torção, explosão, contrachoque, deslizamento e distensão.

- formas de agir do agente vulnerante produtor da lesão corporal:

a.        ativa – o agente vulnerante, dotado de força viva, projeta-se contra o corpo, que está parado.
b.        passiva – o corpo possuído de força viva projeta-se contra o agente vulnerante, que está sem movimento aparente.
c.         mista – o corpo e o instrumento, ambos em movimento, chocam-se mutuamente.

2.2. Instrumentos cortantes (ação simples)

É todo instrumento que agindo por gume afiado, por pressão e deslizamento, linearmente ou obliquamente sobre a pele ou sobre os órgãos, produzem soluções de continuidade chamadas “feridas incisas”. A gravidade de uma ferida incisa depende de sua profundidade e, principalmente, do dano que produzir em órgãos de particular importância da economia; ex.: faca, navalha, bisturi, fragmentos de vidro etc.

Lesões incisas (feridas incisas ou cortantes)
Características das feridas incisas:
-      regularidade das bordas (pois não foi rasgada);
-      regularidade do fundo da lesão;
-      ausência de vestígios traumáticos em torno da ferida;
-      hemorragia abundante;
-      predominância do comprimento sobre a profundidade;
-      afastamento das bordas da ferida, se o corpo é vivo, em razão da retratilidade da pele;
-      cauda de escoriação voltada para o lado em que terminou a ação do instrumento;
-      a extensão da ferida é quase sempre menor do que aquela que realmente foi produzida, em virtude da elasticidade dos tecidos;
-      as vertentes (encostas) da lesão são emparedadas (regulares) e serão verticais se o instrumento agiu perpendicularmente, e em forma de bizel se o instrumento agiu inclinadamente (oblíquo);
-      o centro da ferida é mais profundo que as extremidades.
Nas feridas incisas, quando existem duas lesões cruzadas, é possível determinar qual a primeira e qual a segunda, pois a primeira foi feita sobre a pele íntegra e, na segunda, vai haver um degrau, porque foi feita sobre a lesão anterior. A esse “degrau” dá-se o nome de Sinal de Chavigny: angulação que se verifica na segunda ferida, na hipótese de duas feridas se entrecortarem.
         Algumas feridas incisas têm nome próprio:
- Incisão: costuma ser reservado às feridas produzidas pelo cirurgião com finalidade terapêutica.
- Evisceração: é a expulsão das vísceras através da abertura de todos os planos da parede abdominal, notadamente em indivíduos magros;
- Esgorjamento: é o nome que se dá as lesões produzidas por instrumentos cortantes e, eventualmente, por instrumentos cortocontundentes nas regiões anterior e/ou laterais do pescoço; com relação à direção, a ferida incisa pode ser transversal ou oblíqua;
- Degolamento: é o nome dado às lesões produzidas por instrumentos cortantes e, eventualmente, por instrumentos cortocontundentes na região cervical ou posterior do pescoço;
- Decapitação: é a completa separação da cabeça do restante do corpo, produzida especialmente por instrumentos cortocontundentes.
2.3. Instrumentos contundentes (ação simples)

É todo agente mecânico, líquido, gasoso ou sólido, rombo, que, atuando violentamente por pressão, percussão, torção, explosão, sucção, distensão, flexão, compressão, descompressão, arrastamento, deslizamento, contragolpe ou de forma mista, traumatiza o organismo; ex.: mãos, pés, bengala, barra de ferro, pedra, tijolo, pavimentos, desabamentos, veículo (atropelamento) etc.; provocam ferimentos pelo choque, acompanhado ou não de deslizamento; a lesão produzida é a contusa.

2.3.1 Lesões contusas:

Suas características são:
-      bordas irregulares;
-      traumas nas proximidades das bordas;
-      vertentes e fundo irregulares;
-      entre uma lateral e outra pode haver ponte de tecido íntegro;
-      sangram menos;
-      são mais profundas do que compridas.

As contusões podem provocar também ruptura de órgãos internos. Existem órgãos que, por suas características, são mais sujeitos à ruptura, como o fígado e o baço.
As contusões podem provocar ainda algumas lesões típicas. Ex.: martelada na cabeça provoca uma lesão característica que recebe o nome de ferida de Strassmann. Outra característica da pancada com martelo é o sinal de Carrara (pequenos círculos na região afetada).

2.3.2 Classificação das lesões

- eritema ou rubefação - É a primeira lesão provocada por objeto contundente e a mais simples. Não há lesão anatômica, somente uma mancha vermelha transitória que não deixa vestígios. É provocada por impacto de baixa densidade, produzindo uma dilatação dos vasos sangüíneos. Enquanto existir, retrata com fidelidade o instrumento que a causou. Ex.: tapa.
- escoriação – É a lesão superficial de atrito (ralada) que rompe a epiderme, deixando a derme a descoberto. Não há sangramento e não deixa seqüelas. A escoriação é produzida quando o instrumento tangencia e produz um ralamento na epiderme
- equimose – Se a lesão foi provocada com tal intensidade que chegou a romper alguns vasos sangüíneos, recebe o nome de equimose. São as famosas manchas roxas provocadas por ruptura de vasos capilares, que são vasos pouco expressivos, perto da superfície da pele. Não há sangramento, mas pequena infiltração de sangue entre as malhas do tecido. As manchas seguem uma evolução padronizada: mudam de cor até o décimo quinto dia, quando então desaparecem.
- hematoma – Ocorre quando o instrumento contundente, atuando no tecido corporal, provoca ruptura de vasos importantes, produzindo o afastamento de tecidos;  quando o instrumento bate mais pesado e chega a romper um vaso, provocando vazamento de sangue.
- bossa sanguínea e/ou linfática – equimose com grande infiltração de sangue acumulado em protuberância, comum no couro cabeludo (“galo”).
- lesões profundas – roturas de órgãos e tecidos internos em extensão significativa.
- luxações – deslocamento traumático de ossos, com rotura de ligamentos.
- fraturas – quebra de estruturas ósseas, às vezes internas, outras vezes expondo fragmentos dos ossos (“fratura exposta”).
- esmagamentos – contusões profundas e de grande extensão, normalmente fatais.
- empalamentos - O indivíduo é amarrado e suspenso. Coloca-se uma haste e o indivíduo é descido pela haste, que penetra na região perianal. Era uma prática utilizada como pena de morte. Acidentalmente podem ocorrer empalações. Ex: quedas a cavaleiro; quedas no campo da construção civil.
- lesões produzidas por cinto de segurança - Quando a colisão ultrapassa em energia a capacidade do cinto, ele passa a funcionar como instrumento contundente. Hoje existem 4 tipos básicos de cinto: pélvico, transverso toráxico, cinto de três pontos e cinto de cinco pontas (competição).     

2.3.3 Espectro equimótico Legrand De Saulle

                                 Coloração                       Idade da lesão
                     - cor vermelho escura                  minutos à horas
- cor negra ou arroxeada               2 a 3 dias
                     - cor azulada                                              3 a 6 dias
                     - cor esverdeada                           6 a 10 dias
                     - cor verde amarelada                    10 a 15 dias
                     - cor amarelada                            16 a 20 dias


2.4. Instrumentos perfurantes (ação simples)

É todo instrumento puntiforme, cilíndrico ou cilindrocônico, em que o comprimento predomina sobre a largura e a espessura; agem por percussão ou pressão por um ponto, afastando fibras, sem seccioná-las; a lesão produzida é a punctória (pequena superfície e grande profundidade); as Leis de Filós e Langer, definem o aspecto da ferida punctória, na pele; ex.: agulha, estilete, prego, sovela, furador de gelo etc.
Nestas lesões há marcado predomínio da dimensão da profundidade sobre as dimensões de superfície (comprimento e largura). Sua forma é definida pelas linhas de força da pele do local e pelo calibre e forma do instrumento. Costuma ser circular, elíptica ou triangular. As dimensões na superfície são habitualmente menores que o calibre do instrumento, devido à elasticidade dos tecidos. Tal característica não se manifesta nas feridas produzidas nos cadáveres.
Feridas punctórias são feridas produzidas por instrumentos perfurantes, porém apresentam características de corte, como a casa de um botão; em razão disso, surgem três leis a respeito das feridas punctórias:
1.ª Lei: as feridas punctórias provocam, quando retirado o instrumento, a forma de casa de botão ou botoeira;
2.ª Lei: feridas punctórias numa mesma região de linhas de tensão ou linhas de Languer, têm todas o mesmo sentido;
3.ª Lei: diz respeito às feridas que acontecem coincidentemente numa mesma região de linhas de tensão, e diz respeito à forma que a lesão vai apresentar, ou seja, forma triangular.

2.5. Instrumentos cortocontundentes (ação mista: cortante+contundente)

Estas lesões podem assumir os mais variados aspectos, mas têm como características constantes os bordos nítidos mas contundidos, freqüentemente lineares.

2.6. Instrumentos perfurocortantes (ação mista: perfurante+cortante)

São produzidas por instrumentos que possuem ponta e gume como faca, punhal, lima. Há predomínio da profundidade sobre a largura e comprimento. Na superfície, se traduz por uma fenda regular com uma extremidade arredondada e outra em ângulo agudo (no caso dos instrumentos de um só gume como as facas), duas extremidades em ângulo agudo (no caso dos instrumentos de dois gumes como os punhais) ou em forma triangular ou estrelada (no caso dos instrumentos com mais de dois gumes como as limas).

2.7 Instrumentos perfurocontundentes (ação mista: perfurante+contundente)

É todo agente traumático que, ao atuar sobre o corpo, perfura-o e contunde-o, simultaneamente; a lesão produzida é a pérfurocontusa; ex.: ponteira de guarda-chuva, projéteis de arma de fogo (PAF) etc.; no tocante, aos projéteis de arma de fogo, as lesões se devem, mais freqüentemente, a “bala” do que à carga de chumbo (grânulos). (E = mv²/2).
São as lesões típicas dos projéteis de arma de fogo. As lesões produzidas são decorrência de mecanismos diretos (ação de martelo e cunha, percutindo, rompendo e afastando os tecidos) e indiretos (ação hidráulica ou explosiva em conseqüência das ondas de choque que se propagam em função do elevado teor líquido dos tecidos). Este último explica lesões afastadas do trajeto do projétil. Pode existir um terceiro mecanismo de lesão que é a formação de projéteis secundários pela fragmentação do projétil ou pelo estilhaçamento de estruturas ósseas atingidas (FRANÇA, 2008).
Quando o projétil atinge o organismo e nele penetra, pode atravessá-lo ou ficar nele retido; se considerarmos o túnel que o projétil cria no corpo da vítima, veremos que pode ser penetrante, transfixante (há orifício de entrada e de saída) ou tangencial quando o projétil apenas resvala na superfície
Trajeto do projétil é o caminho que une a lesão de entrada e a de saída ou o local onde o projétil se aloja. Nem sempre é retilíneo, podendo assumir as formas mais caprichosas em função dos desvios de direcionamento causados pelas variadas resistências oferecidas pelos tecidos que atravessa. Os desvios de trajeto são também função inversa da energia cinética do projétil, a qual depende de sua massa e velocidade.

2.7.1 Orifício de Entrada

A sua forma é circular, quando o projétil incide perpendicularmente e habitualmente ovalada quando o faz obliquamente e as suas dimensões são menores que o diâmetro do calibre do projétil;
Estudando o orifício de entrada do projétil, encontramos as chamadas orlas (sinais provocados pelo projétil) e zonas (sinais produzidos pela carga explosiva), são as seguintes:

- orla de contusão - ao penetrar do projétil, a pele se invagina como um dedo de luva e se rompe; devido à diferença de elasticidade existente entre a epiderme e a derme, forma-se uma orla escoriada, contundida;
- orla de enxugo - o projétil vem girando sobre o seu próprio eixo e revestido com impurezas provenientes da pólvora e dos meios anteriormente atravessados; como o tecido orgânico é elástico, adere à parede lateral da bala que, por atrito, vai deixando coladas no túnel por ela mesma cavado essas impurezas trazidas do exterior; dessa forma o projétil “se limpa” ou se “enxuga”, formando a orla de enxugo;
- orla de chamuscamento: área de queimadura da pele produzida pelos gases aquecidos expelidos pela boca da arma. Presente apenas nos tiros de curta distância ("queima roupa");
- zona de tatuagem - também chamada tatuagem verdadeira, por não ser removível; há incrustração dos grânulos e poeiras que acompanham o projétil; é observável em disparos próximos, impregnação da pele pelos grãos de pólvora incombustos; às cores será negra, cinzenta ou esverdinhada, consoante seja a pólvora negra ou piroxilada;
- zona de esfumaçamento (negro de fumo) - também chamada zona de tatuagem falsa, é a mancha esfumaçada sobre a pele nos tiros com a arma apoiada ou à queima-roupa, devido à deposição de fuligem ao redor do orifício de entrada, resultante da pólvora combusta, que recobre e ultrapassa a zona de tatuagem. É o simples depósito de pólvora incombusta e impurezas, facilmente removíveis.
- câmara de mina ou buraco de mina: quando o disparo é feito com a boca da arma apoiada na pele, os gases e resíduos expelidos penetram pelo orifício feito pelo projétil. Os gases se expandem e retornam pelo mesmo caminho, dilacerando e revirando os bordos da ferida de dentro para fora. Tal fato confere ao ferimento um aspecto que lembra o solo revolto pela explosão de mina subterrânea. Logicamente, neste tipo de ferida, a zona de tatuagem de pólvora não será encontrada na superfície externa e sim na intimidade dos tecidos internos.


2.7.2 Orifício de saída

É a lesão produzida pelo projétil em sua saída do corpo. Suas características são:     - forma variada em função das deformações sofridas pelo projétil ao se impactar contra diversas estruturas internas;
- dimensões maiores ou menores, dependendo do sítio de saída, que as do orifício de entrada também em função da deformação do projétil;
- bordos evertidos ou seja, voltados para fora;
- maior sangramento em função da eversão dos bordos


2.7.3 Tipos de disparo – quanto a distância

Levando-se em conta a distância do disparo, os tiros são usualmente classificados em: encostados ou apoiados, curtíssima distância (“tiro à queima-roupa”, até 5 cm), a curta distância (até 1 m) e à distância (mais de 1 m).
A distância que corresponde a cada um desses tipos de tiros varia em função da arma e da munição utilizadas, mas, é relativamente fixa para a mesma arma e munição. Chega a um máximo de 70 cm para as armas civis. Há, porém que se considerar que a presença de vestes pode impedir a formação destes elementos na pele.

2.7.3.1 Tiros encostados

Quando o orifício do cano está encostado à pele, não há espaço entre o cano e a pele. Acontece uma explosão interna: gases, pólvora, fumaça, fica tudo sob a pele. Essa ferida recebe o nome de zona de Hoffman.
Após o disparo, a zona atingida fica estufada e crepita (sinal de crepitação). A área fica meio abaulada. Esse sinal só vale para os primeiros momentos após o disparo.
O disparo encostado produz a impressão do cano quente na pele. Essa impressão recebe o nome de sinal de Werkgaertner.
Existe uma outra hipótese, quando o revólver não está totalmente encostado à pele. Isso gera uma figura diferente, o sinal de Werkgaertner aparece pela metade, em forma de meia lua.
Nos três tipos de disparos, as bordas da ferida estão voltadas para dentro. No ser humano vivo, os orifícios de entrada são menores que o diâmetro do projétil, por causa da elasticidade da pele.

São características das feridas produzidas por tiro encostado:
·     orifício de diâmetro menor que o projétil;
·     marca quente, desenhando a boca do cano na pele (sinal de Werkgaertner);
·     a forma do orifício é irregular, denteada e com entalhes, devido à ação resultante dos gases que deslocam e dilaceram o tecido (sinal de Hoffmann);
·     em geral, não há zona de tatuagem e esfumaçamento, pois os elementos da carga penetram pelo orifício da bala.

2.7.3.2 Tiros à queima-roupa
Se o alvo estiver colocado a 10 cm da arma, o projétil, além de contundir e perfurar, queimará a pele, provocando uma zona de queimadura.
O projétil, perfurando a pele, rompe pequenos vasos, formando a zona equimótica.
Devido à rotação, o projétil provoca na pele uma escoriação. Onde o projétil perfurar, haverá uma zona de escoriação. Essa zona recebe o nome de zona de Fisch.
Chegam também à ferida os detritos da bucha, que são retidos pela pele, que se chama zona de enxugo. Nessa zona de enxugo serão encontrados tudo o que o projétil leva pelo caminho (tecido, sujeiras etc.; coisas que estão interpostas entre o cano e a pele do indivíduo).
A pólvora que chega junto com o projétil e que se aloja na pele, produz a zona de tatuagem.
Por fora dessa zona, a fumaça: zona de esfumaçamento (é a mais periférica de todas).
A característica da zona de esfumaçamento é que pode ser facilmente retirada com uma simples limpeza no local. Se traçarmos uma linha da zona de esfumaçamento, teremos a figura geométrica de um cone. Quanto maior a base do cone, maior a distância entre a arma e o alvo.
É possível, a partir do exame da ferida, determinar a qual distância foi dado o tiro.
A zona de Fisch alongada aponta na direção de onde veio o projétil. Nos orifícios ovais, a maior extensão da zona de Fisch indica a direção do projétil.
São características do furo de entrada nos tiros à queima-roupa:
·     menor que o diâmetro do projétil, devido à elasticidade da pele;
·     forma circular se o disparo for perpendicular à pele, e forma ovalar se o disparo for tangencial;
·     a borda está voltada para dentro;
·     presença de orla de escoriações (zona de Fisch);
·     zona de enxugo;
·     zona de tatuagem;
·     zona de esfumaçamento periférico;
·     auréola equimótica;
·     zona de queimadura - a borda é ligeiramente queimada pelo calor do projétil;
·     zona de compressão de gases, vista apenas nos primeiros instantes.

 2.7.3.3 Tiros à distância

São características do orifício de entrada:
·     forma arredondada ou ovalar, dependendo do disparo, se for perpendicular ou oblíquo em relação à vítima;
·     quando o tiro é dado em perpendicular, o diâmetro da ferida é menor que o projétil;
·     a orla de escoriações tem aspecto concêntrico nos orifícios arredondados e em crescente ou meia lua nos orifícios ovalares;
·     presença da auréola equimótica (ruptura de pequenos vasos localizados na vizinhança do ferimento);
·     bordas para dentro.

São características de saída do projétil das feridas produzidas por arma de fogo:
·     o orifício de saída é maior que o de entrada;
·     a forma é de ferida estrelada (rasgada com as bordas voltadas para fora);
·     nunca tem zona de Fisch, nem qualquer outra lesão de pele, pela simples razão que em momento algum o projétil tocou a superfície da pele na saída, ele a vulnerou de dentro para fora;
·     pode haver zona de enxugo, pois o projétil pode levar tecidos, fragmentos de osso etc.

De maneira geral, a linha reta que une o orifício de entrada e o orifício de saída representa o trajeto do projétil dentro do corpo.
Em várias ocasiões, o projétil pode mudar de trajeto dentro do corpo, pode se fragmentar e pode, também, mudar de ângulo.
Na cabeça, conforme o grau de impacto, pode ocorrer um fenômeno: O couro cabeludo é móvel, e sob o couro existe um tecido mole. Algumas vezes, o projétil passa pelo couro cabeludo e não penetra na cabeça, dando-se o nome de bala giratória. A bala faz o trajeto entre o couro cabeludo e o tecido que envolve o crânio.
A localização do projétil de arma de fogo dentro do corpo humano é extremamente difícil sem o auxílio do raio X, pelo fato de o projétil mudar o seu trajeto dentro do corpo.
Quando o projétil entra, forma um cone que recebe o nome de sinal de Bonnet, onde o orifício de entrada é menor que o de saída. Tem o formato de um funil e, na entrada, o diâmetro menor aponta a direção do projétil.

2.8 Instrumentos Perfuroincisos (ação mista perfurantes+cortantes)

Essas feridas são provocadas por instrumentos de ponta e gume, atuando por um mecanismo misto: penetram perfurando com a ponta e cortam com a borda afiada os planos superficiais e profundos do corpo da vítima. Agem, portanto, por pressão e por seção.
Em uma lesão provocada por uma faca de ponta temos as seguintes características: Na ponta da lesão há a perfuração; no trajeto, o tecido se rasga e, no fundo, há a incisão. Regiões de defesa: braço, antebraço, mão e dorso da mão. Para alguns doutrinadores, num ataque com faca, de acordo com as lesões provocadas nas regiões de defesa, já se convencionou no Tribunal do Júri que não existe o ataque de surpresa, pois as lesões comprovam a defesa e, portanto, conclui-se que não houve surpresa, desqualificando o homicídio.  


3. Energias de ordem física

3.1. Temperatura
3.1.1 Calor

O calor pode atuar de duas formas:
a) Calor difuso
Calor sistêmico, tendo como conseqüência as termonoses:
·           insolação: exposição à natureza;
·           intermação: exposição a outras fontes de calor, ambiente confinado, lugares mal arejados. Pode ocorrer a degeneração das proteínas, desidratação, convulsão e morte.
Portanto as termonoses são os danos orgânicos ou a morte provocada pela insolação, que é a ação da temperatura, dos raios solares, da excessiva umidade relativa e a viciação do ar, a fadiga; ou pela intermação que são os danos orgânicos ou a morte manifestada em espaços confinados ou abertos, sem o suficiente arejamento, quando há elevação excessiva do calor radiante; as causas jurídicas são: acidentes do trabalho e criminosa.

b) Calor direto
Calor local tem como conseqüência as queimaduras, que podem ser causadas por chamas, gases, líquidos ou metais aquecidos. Os materiais em combustão são instrumentos para essa ação. Mais do que a profundidade da queimadura, interessa a sua extensão. Assim, queimaduras de qualquer grau que atinjam mais de 40% da superfície do corpo determinarão a morte do indivíduo.
A observação das queimaduras propicia saber se o indivíduo já estava morto ou não no momento da carbonização. Se morreu no fogo, o sangue dos pulmões e coração possui alta taxa de óxido de carbono, há fuligem e fumaça nas vias respiratórias (sinal de Montalti); só fica na posição de “boxer” se foi carbonizado enquanto vivo ou logo após a morte por qualquer outra causa.
A identificação do morto é feita por meio da ausência de órgãos, disposição dos dentes, fratura óssea antiga e por meio de material genético.
As queimaduras são lesões resultantes da atuação de agentes térmicos sobre o revestimento cutâneo; elas podem ser simples (é a lesão produzida apenas pela ação do calor) ou complexas (é a lesão produzida pela ação do atrito em relação ao calor e a outros fatores próprios do agente agressivo - eletricidade, fricção, raios X, raios gama, líquidos plásticos); elas são classificadas quanto à profundidade. Em Medicina Legal, adota-se a classificação das queimaduras feita por Hoffmann:

a) Primeiro grau - eritema simples
Vermelhão, a pele apresenta-se inchada e quente, dolorida. Presença de eritema (sinal de Christinson). A epiderme descasca após 3 ou 4 dias (ex.: queimadura por raios solares).
b) Segundo grau - vesicação
A superfície apresenta vesículas com líquido amarelado (sais e proteínas). Dependendo da área afetada, pode haver abalos no mecanismo, levando à morte. As bolhas (sinal de Chambert) podem infeccionar, produzindo manchas (ex.: queimadura em decorrência de gases, líquidos e metais aquecidos).
c) Terceiro grau - escarificação
São as queimaduras produzidas, geralmente, por chama ou sólido superaquecido e determinam a queima da pele. A queimadura de terceiro grau incide até no plano muscular. Forma-se uma placa dura e preta que, retirada, resulta em úlcera, sendo necessário o enxerto. A pele fica retrátil, com cicatrizes chamadas sinéquias.
d) Quarto grau - carbonização
É a carbonização do plano ósseo. Pode ser total ou generalizada.
A carbonização total é rara e difícil de ser produzida. A carbonização generalizada reduz o volume do corpo por condensação dos tecidos. Corpos de adultos carbonizados chegam à estatura de 100 a 120 cm. O morto toma a posição de “boxer”, devido à retração dos músculos. A explosão de gases causa o rompimento da cavidade abdominal e do crânio.

3.1.2  Frio

Os seres humanos são homeotérmicos (temperatura constante) e resistem a uma variação de temperatura pequena (abaixo de 42 graus centígrados e acima de 32 graus centígrados de seu próprio corpo). Para tanto, há mecanismos termoreguladores que mantêm a temperatura estável em aproximadamente 36 graus centígrados.
O frio sistêmico faz diminuir as funções circulatórias e cerebrais. A ação do frio leva a alterações do sistema nervoso, sonolência, convulsões, delírios, perturbações dos movimentos, anestesias,  congestão ou isquemia das vísceras, podendo advir a morte.
Os cadáveres têm pele clara, extravasamento de sangue pelas vias respiratórias, resfriam rapidamente e demoram mais para entrar em putrefação.
O frio pode atuar diretamente sobre o corpo. Podem ocorrer geladuras localizadas de vários tipos:
a) Primeiro grau
Área superficial pálida (ou rubefação), inchada e de aspecto anserino na pele. Dura algumas horas e depois cessam os efeitos, porém a pele descasca.
b) Segundo grau
Ação mais intensa do frio, que provoca a destruição da epiderme, com formação de bolhas de sangue que estouram e cicatrizam.
c) Terceiro grau
Quando a ação do frio é muito intensa, provocando o congelamento do local e levando à necrose dos tecidos moles por falta de circulação. Formam-se úlceras e, às vezes, são necessários enxertos. Causam deformidades permanentes.
d) Quarto grau
Quando o indivíduo permanece com os membros em contato direto com o frio. Um grande segmento do corpo gangrena e vai à necrose. Chama-se de trincheira. Hoje ocorre no alpinismo, nas indústrias com câmaras frias etc.

3.2. Eletricidade

A eletricidade natural e a artificial podem atuar como energia danificadora.
A eletricidade natural, quando age letalmente (quando há óbito), denomina-se fulminação. Quando provoca apenas lesões corporais, chama-se fulguração, sinais de Litchtenberg.
A eletricidade industrial é a produzida pelo homem e tem como ação uma síndrome chamada eletroplessão ou eletrocussão . São assim chamadas todas as formas de lesões causadas por eletricidade industrial, com ou sem morte. Sendo que a eletrocussão é a pena de morte em cadeira elétrica. A eletroplessão gera a marca elétrica de Jellineck que é uma lesão de aspecto circular, elíptica ou em roseta aderente ao plano cutâneo subjacente.
Há três hipóteses de morte causada por eletricidade:
·           a carga elétrica leva à contratura, podendo levar o indivíduo à asfixia (contratura dos músculos respiratórios);
·           a carga elétrica leva à desorganização dos batimentos cardíacos, provocando a contração fibrilar do ventrículo e a morte;
·           a carga elétrica leva à parada cerebral ocasionada por hemorragia das meninges, das paredes ventriculares, do bulbo e da medula espinhal.
Na fulguração, as lesões podem ser por queimaduras ou por alterações funcionais dos órgãos citados acima. Mas pode ser que haja resistência, levando ao calor, produzindo queimaduras (“auto-fritura”). É o chamado efeito Joule.
Às vezes, a morte é devida a outras causas sobrevindas de quedas ocasionadas pela eletricidade. Ao receber o choque elétrico, a vítima é precipitada ao solo, morrendo por ação de energia mecânica (contusão).

Intensidade: quantidade de eletricidade que atravessa o condutor, medida em Amperes.
Tensão: indica o potencial elétrico, medida em Volts.
• Baixa: até 120 v. - fibrilação ventricular.
• Média: 120 a 1.200 v. - fibrilação ventricular + tetanização respiratória.
• Alta: 1.200 a 5.000 v. - tetanização respiratória.
• Alta: acima de 5.000 v.- paralisia bulbar, apnéia e parada cardíaca.
Freqüência: é a ciclagem, medida em Hertz.
Resistência: é a oposição oferecida a passagem da corrente e é medida em Ohms.

3.3. Pressão atmosférica

Com a diminuição da pressão atmosférica, há a diminuição de oxigênio e de gás carbônico e o indivíduo passa mal. É o chamado mal das montanhas.
Sofrem aumento da pressão atmosférica os mergulhadores, escafandristas e outros profissionais que trabalham debaixo d’água ou em túneis subterrâneos. Não correm só o perigo do aumento da pressão atmosférica, mas especialmente o da descompressão brusca, que pode causar lesões muito graves. Essa síndrome é conhecida como mal dos caixões.
A natureza jurídica desse evento é quase sempre acidental e desperta interesse no estudo da infortunística (acidente de trabalho).

4. Energias de ordem química

Existem substâncias que, por ação química, física ou biológica, são capazes de causar danos à vida e à saúde.
Quando a ação é de ordem externa, as substâncias recebem o nome de cáusticos. Quando a ação é de ordem interna, as substâncias recebem o nome de venenos.

4.1. Vitriolagem

Vitríolo era o nome empregado para o ácido sulfúrico. Atualmente o termo vitriolagem é empregado para todas as lesões causadas por substâncias cáusticas ou corrosivas.
Entre as substâncias químicas de ação externa, dois grupos são mais importantes: alcáles e ácidos.
·          Efeito coagulante: os cáusticos produzem lesão grave, afetando a pele violentamente, formando escaras (áreas enegrecidas). A evolução mostra que essa área deve ser retirada para que ocorra a cicatrização. O efeito coagulante desidrata os tecidos (ex.: nitrato de prata).
·          Efeito liquefaciente: a substância química atua desfazendo os tecidos. Produzem escaras moles (ex.: soda cáustica).
·          Vitriolagem: é um tipo de comportamento delinqüente, em que alguém joga sobre as pessoas uma substância cáustica. No século XVIII, quando a química começou a desenvolver-se, chamou a atenção dos químicos o ácido sulfúrico, que, na época, chamava-se óleo de vitríolo, daí o nome vitriolagem, dado à atitude de alguém que joga, dolosamente, uma substância química sobre as pessoas.

4.2. Venenos

Venenos são substâncias químicas que, atuando no organismo, vão desempenhar um efeito sistêmico. Veneno é qualquer substância que, introduzida no organismo, danifica a vida ou a saúde. Entende-se por envenenamento, portanto, a morte violenta ou o dano grave à saúde, ocasionados por determinadas substâncias de forma acidental, criminosa ou voluntária.

2.2. Ação Interna (venenos)

São substâncias que introduzidas no organismo, independente da dose e agindo quimicamente, causam danos graves à saúde, podendo causar a morte; podem ser agrupados em: voláteis (álcool, clorofórmio, benzina, ácido cianídrico etc.), gasosos (óxido de carbono, vapores nitrosos e gás sulfídrico etc.), minerais (chumbo, mercúrio, arsênico etc.), orgânicos fixos (medicamentos - barbitúricos, glicosídeos, alcalóides etc), origem animal (de cobras, aranhas, escorpiões, vespas, abelhas etc.), origem vegetal (mandiocabrava, mamoma, arruda, fungos etc.) e origem alimentar (ingestão de alimentos deteriorados).
Os venenos apresentam-se em outros dois grandes grupos: organofosforados e clorados.
Tanto um grupo como o outro, principalmente os organofosforados, podem ser causadores de envenenamento por contato com a pele, ingestão e inalação. A morte ocorre por parada respiratória e edema pulmonar. O indivíduo fica cianótico (roxo), o que é um sinal de que está havendo má respiração dos tecidos.
Os clorados são menos perigosos, porém podem envenenar o sistema nervoso central (ex.: formicida, gás metano, combustíveis, dependendo da quantidade).
As noções do veneno, necessariamente, passam pela consideração de ordem quantitativa.
Não basta, apenas, a qualidade da substância, é preciso que haja uma certa quantidade.
Essa noção de quantidade passa a envolver praticamente todas as substâncias.
Existem substâncias que, em quantidade muito pequena, podem produzir a morte (ex.: estricnina – 1mg pode causar convulsão, contratura e morte); porém, 1 milésimo de miligrama pode servir como remédio.
A mesma cocaína que excita, numa quantidade maior, pode ocasionar a morte, num efeito inverso. A variação da quantidade pode inverter o efeito da substância.

5. Energias de ordem físico-quimicas
6. Energias de ordem bioquímica
7. Energias de ordem biodinâmica

Cuida-se da síndrome ocorrente no organismo pela impossibilidade de se adaptar precoce ou tardiamente, temporária ou definitivamente, ou recuperar o equilíbrio em razão da agressão sofrida e, ocorrendo diminuição da função circulatória e comprometimento do metabolismo celular, podendo ocasionar a morte; essas agressões são hemorragias intensas, queimaduras extensas e profundas, áreas de esmagamento e compressões violentas e graves do tórax, crânio etc., então dizer-se que houve choque; a condição básica da ocorrência do choque é a diminuição da circulação sanguínea e queda da pressão arterial, além de alterações metabólicas que alteram o funcionamento dos órgãos vitais, levando à morte.

8. Energias de ordem mista